Os resultados da última eleição no Reino Unido explicitaram ainda mais aquela tendência que já vinha se acumulando ano após ano (com efeito, ao longo de várias décadas em muitos países): a esquerda socialista tradicional não tem nenhum futuro viável na política dos países mais desenvolvidos do mundo.
Sua visão econômica é antiquada e inviável; seu apoio inflexível a generosas políticas assistencialistas em conjunto com a irrestrita abertura de fronteiras (garantindo que imigrantes ilegais sejam bancados com o dinheiro de impostos dos trabalhadores) é extremamente impopular; e ela simplesmente ainda não entendeu a mais premente realidade política da nossa era: poucas pessoas no mundo desenvolvido confiam nos governos.
Se toda a sua ideologia se resume a dizer às pessoas que elas devem confiar no governo e devem acreditar que ele fará coisas gloriosas, você está encrencado.
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Como já era esperado, com a estrondosa vitória do Partido Conservador — a maior desde 1987, com Margaret Thatcher — e a estrepitosa derrota do Partido Trabalhista — a pior desde 1935 —, a mídia mundial entrou naquele estado de negação da realidade.
Igual ao acontecido nos EUA
Lembra-se de como a grande mídia — e todos os seus intelectuais e analistas favoritos — passou semanas, até meses, em completa negação da espantosa realidade de que Donald Trump havia vencido a eleição de 2016?
Jornalistas, intelectuais e analistas fizeram esforços hercúleos para tentar se consolar e acreditar que tudo aquilo realmente não tinha acontecido, e que tudo era apenas um temporário atraso na inevitável marcha progressista da história. Talvez alguém manipulou alguma coisa. Alguém ou alguma coisa trapaceou e conseguiu alterar a inalterável narrativa segunda a qual apenas a esquerda pode vencer eleições.
Houve várias desculpas para tentar explicar por que todo mundo errou as previsões e Trump venceu: racismo, machismo, ressentimento, os deploráveis, a Rússia, o Facebook, fake news, a presença constante de Trump na mídia, e por aí vai. Três anos depois, e ainda é a mesma coisa.
Ainda hoje não há aceitação, mesmo com todas as probabilidades apontando maciçamente para outro mandato de Trump (seus apoiadores ficaram ainda mais energizados com a tentativa de impeachment feita pelo Partido Democrata, e até mesmo os eleitores independentes passaram a apoiá-lo).
Eis a única narrativa que raramente é ouvida: a esquerda se tornou inócua, e até mesmo uma presa fácil, pois não tem mais pensamento próprio; está morta do pescoço para cima. O único programa que ela tem a apresentar é a defesa daquela velha ordem que se resume a comandar, mandar e controlar. Consequentemente, qualquer figura pública minimamente convincente que seja um não-esquerdista é capaz de derrotar estes arautos do atraso e do totalitarismo — ou seja, a esquerda progressista de fato merece continuar perdendo eleições.
De volta ao Reino Unido
Algo similar aconteceu na acachapante vitória dos Conservadores no Reino Unido. A incrível e abrangente vitória de Boris Johnson — cuja imagem a imprensa assegurava estar irremediavelmente abalada por causa de sua inflexível defesa do Brexit — deixou a mídia convencional em estado de choque e espanto.
A devastação é palpável, desencadeando a maior transformação da política britânica desde a Segunda Guerra Mundial. Os Conservadores ganharam 365 assentos no Parlamento, ao passo que os Trabalhistas ficaram com 203. Considerando todos os outros partidos, os Conservadores passaram a deter uma maioria de 75 assentos, a maior em mais de três décadas. Distritos no norte da Inglaterra, que até então eram uma fortaleza do Partido Trabalhista (chamados de Red Wall — Muralha Vermelha), mudaram impressionantemente de rumo, e votaram nos Conservadores.
Além de o mandato dado pelos eleitores a Johnson ser comparável apenas à vitória de Margaret Thatcher em 1987, é impossível negar que houve uma ampla ratificação pública ao desejo de sair da União Europeia. Mais do que isso, foi um profundo golpe ao Partido Trabalhista e a tudo o que ele representa e defende. Seu líder Jeremy Corbyn — um auto-proclamado «socialista democrático» cuja maior contribuição à vida pública foi dar ao progressismo da década de 1970 uma nova visibilidade — irá renunciar à liderança e o Partido terá de se reagrupar e repensar totalmente sua ideologia caso queira voltar a ser relevante. Sua acachapante derrota ressoou nos partidos de esquerda ao redor do mundo.
«A explícita rejeição ao socialismo e ao gigantismo estatal defendido pelo Partido Trabalhista», escreveu Roger Cohen, do The New York Times, «traz um prospecto sombrio para aqueles que acreditam que o Partido Democrata pode manter sua atual guinada à extrema-esquerda (com Bernie Sanders e Elizabeth Warren) e vencer eleições. A classe trabalhadora britânica não se entusiasmou com as propostas do Partido Trabalhista de estatizar as ferrovias, a distribuição de eletricidade e os sistemas de água e saneamento».
Ao redor do mundo
Tenha em mente, também, que este efeito não está limitado aos EUA e ao Reino Unido. A ascensão do nacionalismo na Europa — que vem causando algumas preocupações justas, mas também um pânico injustificável — não se trata de um apelo para que uma mão forte reacionária reverta a modernidade; trata-se, isso sim, do completo fracasso da esquerda e de seu projeto estatizante em convencer o cidadão comum de que este é o modelo que realmente irá consertar o que há de errado no mundo.
Os eleitores ao redor do mundo desenvolvido estão ficando cada vez mais espertos com o passar das décadas. Quando políticos progressistas atacam os ricos, defendem mais dinheiro para programas governamentais, exigem mais regulações e controles sobre o setor privado, atacam os mercados financeiros, e dizem querer mais coisas gratuitas para todos, o povo imediatamente percebe a armadilha: implantar tudo isso significa colocar mais poder nas mãos do estado (políticos e burocratas).
Eis a escolha fundamental que nenhuma retórica poderosa ou linguajar elegante podem mudar: ou nós confiamos na sociedade, na livre iniciativa e nos mercados (consumidores, investidores e produtores) para nos gerenciarmos a nós mesmos, ou entregamos ainda mais poderes ao estado (políticos e burocratas) para que ele utilize de força e coerção contra nós.
Esta é, em última instância, a realidade que desmascara todos os defensores do socialismo. O coletivismo de esquerda não é, no final, um meio de melhorar a sociedade; ele é, isso sim, um meio de se transferir poder das pessoas que estão fora do governo para as pessoas que estão dentro do governo.
Há também a questão da direção da história. Por um século e meio, as forças propulsoras da esquerda socialista (em todas as suas variedades) foram sustentadas por uma estranha e insensata crença de que a história se movia inexoravelmente em sua direção. Qualquer coisa que empurre em direção ao socialismo é progresso; qualquer coisa que rejeite o socialismo é reacionária. Ao termo ‘reacionário’ você pode acrescentar outra longa lista de epítetos: racista, machista, sexista, fascista, xenófobo, patriarcal, homofóbico, transfóbico, fanático, qualquer coisa.
Este é o modelo simplório que eles carregam na mente para justificar (e para evitar ter de lidar com) seus contínuos fracassos.
O maior fracasso atual é a ausência de uma visão viável que ofereça esperança para um futuro mais pujante. Ao contrário: tudo o que a esquerda tem a oferecer é o mesmo e velho ressentimento de classe, mais confisco e redistribuição de renda, mais estatizações de indústrias, mais poderes aos sindicatos (principalmente dos funcionários públicos), e a inflexível defesa de mais e mais impostos. Acima de tudo, a ideologia esquerdista de hoje insiste que devemos confiar no governo (mas só no governo comandado por eles, é claro).
Após várias décadas de fracasso abissal de todas estas abordagens, a esquerda está tendo enormes dificuldades em manter sua credibilidade.
Adicionalmente, a oposição à esquerda está ficando mais esperta. Por exemplo, houve uma sutil mudança na maneira como Boris Johnson começou a defender a ideia do Brexit. Ele passou a rejeitar o isolacionismo e o protecionismo de vários dos apoiadores do Brexit. Ele falou abertamente de livre comércio com os EUA, com a União Europeia e com o resto do mundo. Ele falou de abertura, de oportunidade e de esperança. Ele passou a caracterizar o problema com a Comunidade Europeia como sendo o de uma burocracia descontrolada, algo que estava impedindo o Reino Unido de almejar aspirações mais altas.
Tudo isso significa que sua retórica passou a se assemelhar muito mais à visão liberal-clássica do que àquela da esquerda e da direita atuais. Este parece ser um programa vencedor.
Por ora, tudo indica que a esquerda progressista simplesmente ainda não se deu conta de que vem continuamente perdendo eleitores, e que tal fenômeno vem ocorrendo há décadas: mais especificamente, desde a ascensão de Reagan e Thatcher, a qual de fato representou uma mudança efetiva na maré da política, e não apenas um recuo temporário.
É o fim ou não?
Por tudo isso, não é desarrazoado prever que realmente estamos testemunhando os últimos dias da esquerda. No entanto, tão logo dizemos isso, as evidências contrárias se apresentam. O que dizer, por exemplo, do controle quase hegemônico da grande mídia, da academia e de todos os outros «respeitáveis veículos de opinião»? Estes estão cada vez mais parecidos com observatórios isolados, nos quais um semi-marxismo ainda sobrevive apesar de todas as tendências em contrário na vida pública moderna.
Na prática, porém, a visão esquerdista da maioria dos acadêmicos nada mais é do que um incômodo. Peguemos, por exemplo, um recente exemplo de um acadêmico progressista que tentou resenhar a Escola Austríaca de Economia. Como todo progressista, ele está invariavelmente preso aos clichês de sempre: para ele, qualquer defesa da economia de mercado significa defender os interesses do capital à custa do bem-estar dos trabalhadores (sendo que a realidade é oposta). A partir daí, como previsto, tudo desanda e a análise se degenera e acaba recaindo em todos aqueles lugares-comuns favoritos da esquerda moderna: fascismo e patriarcado do homem branco, o que por sua vez está ligado ao racismo e ao autoritarismo.
E, no final, ele conclui que os economistas austríacos não eram liberais, mas sim homens brancos privilegiados que estavam apenas tentando racionalizar os interesses de sua classe.
E é exatamente assim que a esquerda progressista vem respondendo aos seus crítico há um século e meio: caluniando e difamando. É claro que chega um momento em que todo o truque cansa e perde o encanto.
Para piorar, parodiando Talleyrand, a esquerda não aprendeu nada e não esqueceu nada. As categorias de capital e mão-de-obra já são tão corriqueiras, que a noção de que ainda existe algum tipo de conflito intratável entre ambas (pensamento em voga no século XIX) é refutada por praticamente toda as experiências atuais. Mas os partidos de esquerda continuam agindo como se houvesse algum ressentimento profundo das classes trabalhadores contra os proprietários das empresas.
Ao agirem assim, eles erram totalmente o diagnóstico do real ressentimento das pessoas: não é contra empreendedores, mas sim contra impostos, burocracias, regulações, proibições, planos arrogantes feitos por burocratas para serem implantados de cima para baixo, promessas de belos programas estatais que, no final, serão manipulados por grupos de interesses, e por aí vai.
As panaceias capitaneadas pela esquerda atual — mais socialismo, mais controle estatal, maiores impostos, mais assistencialismo, mais programas governamentais, mais promessas de «tudo grátis» —já estão mofadas e desacreditadas. No entanto, por algum motivo, a ideologia socialista parece causar algum tipo de congelamento cerebral que faz com que até mesmo o mais culto dos intelectuais passe a ignorar toda a realidade empírica, mesmo aquela que mostra seu próprio partido político sendo trucidado eleição após eleição, país atrás de país.
Sendo assim, estou confortável em prever mais «surpresas» eleitorais que irão empurrar a esquerda progressistas cada vez mais para as margens da vida política. A academia é o seu último porto seguro, e é onde ela irá se apegar com cada vez mais resiliência. Se e em que grau isso terá algum impacto no desenrolar da história no mundo real ainda é uma questão em aberto.
Para concluir
É verdade que toda esta tendência não representa um bem absoluto. Em vários países, há aqueles conservadores que não se sentem bem em adotar o liberalismo econômico clássico (como a família Le Pen, na França), de modo que a ascensão de um coletivismo de direita contra um redistributivismo de esquerda também tem seus próprios problemas.
Mas não deixemos passar este momento sem celebrar a gradual demolição de uma perspectiva ideológica que causou vastos estragos por um século.
Estamos vivendo em uma era pós-paradigmática/pré-paradigmática. As ideologias que defendem o controle estatal, além de serem insustentáveis, estão caindo em descrédito. Cabe agora aos genuínos defensores da liberdade humana aproveitarem a oportunidade e apresentarem seus argumentos.
Jeffrey Tucker é diretor-editorial do American Institute for Economic Research. Ele também gerencia a Vellum Capital, é pesquisador sênior do Austrian Economic Center in Viena, Áustria. Associado benemérito do Instituto Mises Brasil, fundador e diretor do Liberty.me, consultor de companhias blockchain, ex-editor editorial da Foundation for Economic Education e Laissez Faire books, fundador do CryptoCurrency Conference e autor de diversos artigos e oito livros, publicados em 5 idiomas. Palestrante renomado sobre economia, tecnologia, filosofia social e cultura
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